O que nós devemos saber sobre a ciência da dor?

de Ryan Crandel, FAFS

 

Houve uma mudança de paradigma de informação que se introduziu no mundo médico e do movimento no que se refere à ciência da dor nos últimos 20 anos. Infelizmente, a maior parte não chegou às camadas mais profundas da academia, mas a informação está disponível para ser utilizada para todos os que estão interessados em lidar com um enorme segmento da população que precisa da nossa ajuda. Este artigo foi escrito para o profissional do movimento como um adendo sobre como tratamos e treinamos nossos clientes e pacientes.

Durante séculos (isso inclui o que a maioria das pessoas pensam atualmente), acreditava-se que a dor era proveniente de sensores detectores de dor na pele, enviados ao cérebro para que sentíssemos e, portanto, fizéssemos algo a respeito. De fato, o famoso cientista, Rene Descartes, destacou este suposto fenômeno com a ilustração abaixo:

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Infelizmente, essa simplificação bruta da dor é altamente imprecisa e as últimas duas décadas da neurociência, que utiliza fMRI, mostrou que a dor é muito mais complexa do que apenas 2+2=4.

Então, o que é a dor?

De acordo com o renomado pesquisador de dor e fisioterapeuta australiano, a dor “… é produzida pelo cérebro depois que a assinatura neural de uma pessoa foi ativada e concluiu que o corpo está em perigo e que a ação é necessária”. Outra definição por um brilhante psicológico, chamado Ronald Melzack, que resume a dor como:

“A teoria neuromatrix da dor propõe que a dor é uma experiência produzida por padrões característicos de neurossignação de impulsos nervosos gerados por uma rede neural –  “a auto-neuromatrix do corpo” – no cérebro. Esses padrões de neurossincracia podem ser desencadeados por inputs sensoriais, mas também podem ser gerados independentemente deles. As dores agudas evocadas por breves inputs nocivos, meticulosamente investigados pelos neurocientistas, e seus mecanismos de transmissão sensorial são geralmente bem compreendidos. Em contraste, as síndromes de dor crônica, que são frequentemente caracterizadas pela dor severa associada a pouca ou nenhuma lesão ou patologia perceptível, permanecem como mistério. 

Além disso, o estresse psicológico ou físico crônico é geralmente associado a dor crônica, mas a relação é mal compreendida. A teoria neuromatrix da dor, fornece uma nova estrutura conceitual para examinar esses problemas. Ele propõe que os padrões de produção neuromatrix do próprio corpo ativam programas perceptuais, homeostáticos e comportamentais após a lesão, patologia ou estresse crônico. A dor, então, é produzida pela saída da rede neural amplamente distribuída no cérebro e não diretamente pela entrada sensorial evocada por lesão, inflamação ou outra patologia. A neuromatrix, que é geralmente determinada e modificada pela experiência sensorial, é o mecanismo primário que cria o padrão neural produtor de dor. Esse padrão é determinado por múltiplas influências, das quais a entrada sensorial somatizada é apenas uma parte, que converge para a neuromatrix.”

Embora isso possa parecer confuso à primeira vista, o significado é de que basicamente tudo o que é necessário para alguém sentir dor é ter uma assinatura neural ativada e percebida pelo organismo como ameaçadora de alguma forma.

O que é uma assinatura neural?

Uma assinatura neural (ou neurotag) é essencialmente um padrão da atividade neural no cérebro que nos permite colocar uma experiência sensorial num grande contexto. Esse contexto é filtrado através do nosso passado, do contexto emocional da situação, nossas crenças, consequências das experiências, e se percebemos ou não o quão perigosa é a informação.

Não existe um único centro de dor

A neuromatrix é onde a dor é percebida pelos humanos, não existe numa área do cérebro. A neurossignatura pode ser traçada como uma experiência sensorial que vai de uma região do cérebro para outra, para o processamento e a saída. As regiões do cérebro que compões a neuromatrix, são:

  1. Córtex Motor Pré-Motor – Ajuda a organizar e preparar o movimento.
  1. Córtex Pré-Frontal – Memória e resolução de problemas.
  1. Cíngulo do Córtex – Capacidade de foco e concentração em uma tarefa
  1. Amígdala – Área onde o medo, o condicionamento do medo e o vício são processados.
  1. Córtex Sensorial – Capacidade de discriminar entre objetos que são percebidos pelo sistema nervoso periférico.
  1. Hipotálamo e Tálamo – Resposta ao estresse, motivação e regulação autonômica.
  1. Cerebelo – Ajuste fino de movimento e memória.
  1. Hipocampo – Condicionamento do medo, memória e reconhecimento espacial.
  1. Gânglio Dorsal / Gânglio da Raiz Dorsal – Atua como o segurança, podendo controlar a informação que o cérebro recebe. O cérebro pode realmente controlar a quantidade de informação se quiser, isso é importante, especialmente com a hipersensibilização e Síndrome da Dor Regional Complexa (SDRC)!

Não existe coisa tão grande como uma fibra de dor

Já foi pensado (e ilustrado na imagem de René Descarte) que existem fibras de dor no corpo que, ao serem acionadas, enviam um estímulo doloroso ao cérebro. Embora não existam receptores de dor no corpo, existem nociceptores que transmitem informações ao cérebro em relação à nocicepção e ao perigo.

Os nociceptores transmitem informações relacionadas à deformação mecânica do tecido neural, alterações químicas e térmicas. Essa informação é retransmitida para a medula espinhal. É na raiz dorsal onde a informação pode ser transmitida ao cérebro se a informação for considerada suficientemente importante. Uma vez no cérebro, essa informação passa pela neuromatrix para processamento e saída. Em outras palavras, “sem cérebro, sem dor” e ao longo dessas linhas não é preciso um corpo para ter experiência como uma dor. Um exercício útil que faço com meus pacientes é fazer com que eles fechem os olhos, imaginem um cachorro, um elefante branco e um avião. É possível ver claramente, além de sentir o cheiro, o gosto e a sensação (incluindo a dor) sem realmente receber informações de um órgão sensorial. Portanto, fica claro que é útil comunicar-se com pacientes e clientes de onde vem a dor.

Mas e a dor crônica?

A dor crônica é aquela experimentada depois de 3-6 meses. A maioria dos tecidos cicatriza dentro de seis meses depois de uma lesão e, portanto, a nocicepção diminui/para, mas muitas vezes os pacientes ainda sentem a dor. Esse é um grupo enorme; estima-se que existam 100 milhões de adultos, apenas nos Estados Unidos, que sofrem a dor crônica a qualquer momento. Esse é um grupo de pessoas que se beneficiaria muito com a educação da dor e uma nova abordagem para o movimento que os bolsistas do GIFT e os Cientistas Funcionais Aplicados podem entregar, pois podemos ajustar os movimentos e individualizar o estresse nos tecidos.

Mas ainda não devemos informar os pacientes sobre sua anatomia e suas feridas?

Talvez, talvez não. Mas antes que você passa, pode ser do interesse do paciente lhes dizer que 40% da população geral tem um disco protuberante significativo, mas sem dor. Aproximadamente 25-50% da população geral assintomática tem qualquer um dos seguintes:

– Lágrimas anulares

– Protusões de disco

– Comprimento de perna e pélvis, e/ou coluna

– Degeneração Articular

– Estenose Foraminal

Mas calma, tem mais! 35% da população tem queixas no manguito rotador e, quando estamos 70, 2/3 de nós tem queixas assintomáticas nos nossos manguitos rotadores! Além disso, há cerca de 50% de correlação entre a dor no joelho e a artrite, enquanto um estudo mostrou que 35% dos jogadores de basquete universitário com dor no joelho apresentaram danos significativos na ressonância magnética.

Nós não somos definidos somente pelo que um radiologista pode encontrar em uma varredura! Tecidos são curados e nós somos muito mais robustos do que pensamos. Ao dar os pacientes uma compreensão básica de onde vem a dor e educá-los, nós estamos indo além da curva. Pacientes dotados de munição mental podem ter dor e não danos nos tecidos, e também danos significativos nos tecidos sem dor, nós podemos ter pacientes e clientes capazes de levar suas vidas com menos dor crônica e mais função.

– Deterioração

– Desgasto

– Colapso

– Disfunção

Ao invés disso, nós podemos dizer algo como: “À medida que envelhecemos, ficamos grisalhos e ganhamos rugas na pele. Internamente, as coisas também ficam ‘grisalhas e enrugadas’, mas isso não significa que tem que ter dor”. Nós já fazemos um ótimo trabalho em pessoas dotadas com movimento. Ao adicionar a ciência da dor atual, nós estaremos sendo muito melhores com uma grande população de pacientes que precisa de nossa expertise.

Resumo

– Isso não é um argumento. Compreender a dor só pode ajudar mais pessoas com dor.

– A neurociência recente, baseada no fMRI, mostrou que a dor é uma saída do cérebro.

– Essa dor é uma experiência complexa (neurotag) que vem de muitas áreas cerebrais que podem ou não significar que ainda existe dano tecidual real.

– Os tecidos se curam, mas muitas vezes um organismo ainda sente que existe uma ameaça reconhecida, agarrando-se a um neurotag de dor, como um computador em repetição do mesmo programa por diversas vezes.

– A dor crônica é a dor que permanece depois de 3-6 meses da cicatrização do tecido.

– A dor crônica significa que estamos lidando com mais do que apenas tecido e a educação científica da dor é muito útil para melhorar rapidamente a sua percepção.

– Estamos em um lugar onde podemos usar a CFA, somado à neurociência da dor, para afetar aproximadamente 100 milhões de pessoas.

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